Depois de publicar o ECD, Milu, preocupada que anda com a alarvaria dos docentes, decidiu fazer publicar o EBM - Estatuto das Boas Maneiras, tendo por base um texto ainda hoje muito actual, publicado no século XIX por um assessor (do Ministério da Educação de hoje?) de nome João Félix.
Ramalho Ortigão, em As Farpas, escreveu sobre o assunto:
"Em Portugal todas essas coisas se aprendem nas escolas de instrução primária, e da disciplina formada do conjunto desses preceitos são os alunos devidamente examinados nos liceus nacionais.
O mestre das maneiras portuguesas não é Talma, nem Madame de Girardin, nem Balzac, nem Emerson, nem Carlos Dickens. É simplesmente o Sr. João Félix Pereira, médico, engenheiro civil e agrónomo.
Vejamos algumas dessas leis que as crianças decoram para os seus exames e pelas quais os adultos se governam nas suas correlações sociais.
Para que o sujeito possa a todos os respeitos considerar-se um gentleman, acha conveniente o Sr. João Félix:
1º Que ele faça a barba.
2º Que se não ponha à janela em mangas de camisa nem com o pescoço descoberto.
3º Que quando escarrar o não faça sobre a cara de pessoa com quem fale (maxime se é uma pessoa de respeito!)
4º Que não tenha os olhos em contínuo movimento.
5º Que nos jantares de etiqueta não limpe os ouvidos com o palito com que houver de palitar os dentes.
6º Que não arrote à mesa.
O Sr. João Félix especifica ainda, com um escrúpulo pelo qual nunca lhe poderemos votar o suficiente reconhecimento, que diante de gente de respeito se não cortem as unhas. E assim é! Achando-nos na presença de pessoas que respeitemos, como, verbi gratia, Sua Majestade El-Rei, um príncipe estrangeiro, um embaixador ou uma rainha, o pormo-nos repentinamente a cortar as unhas - principalmente sendo estas as dos pés - poderia ser tido por acto menos palaciano.
Se o Sr. João Félix nos permitisse um leve apêndice aos seus conspícuos preceitos, diríamos que cortar os calos nos parece também operação que só em caso de muita necessidade nos deveremos permitir no meio de grandes assembleias.
Quando se transpire depois da valsa, mudar de camisa no meio de um salão, sem previamente haver obtido para esse fim a permissão da dona da casa, igualmente nos ocorre que poderia por alguns ser talvez arguido como acto de menos etiqueta...
Tratando do modo de proceder à mesa do jantar faz o Sr. João Félix Pereira duas observações muitíssimo sábias.
A primeira é que não tomemos pitada de rapé pelo meio das coisas que estivermos comendo.
Compreende-se todo o alcance desta advertência, reparando-se, por um só momento que seja, nos equívocos a que podia dar origem a concorrência do rapé com os acepipes, resultando por exemplo lançar-se a pitada sobre a salada e meter-se no nariz beterrabas!
A segunda advertência é que nunca metamos bocado nenhum na boca enquanto não tivermos engolido o bocado antecedente. Ninguém imagina sem o ter experimentado quanto importa ser cauteloso na matéria deste capítulo! Metendo na boca os bocados sem tomarmos a deliberação de os irmos sucessivamente engolindo, chegamos por espaço de tempos a uma indefinida aglomeração de bocados dentro da nossa boca. As pessoas que insistem, por tenaz grosseria, em não engolirem os bocados que vão metendo consecutivamente na boca caem, ao cabo de alguns dias dessa terrível incúria, na dura necessidade de depositarem os bocados antigos que tenham entre a maxila superior e a maxila inferior, a fim de receberem bocados novos. Quando isto haja de se fazer convém que se tenha em vista o que o Sr. João Félix discretamente consigna com respeito aos escarros, isto é: que tais esvaziamentos se façam o menos que ser possa sobre os penteados das pessoas que nos cerquem, e muito mais particularmente quando estas tenham tido a precaução de nos advertir de que tais depósitos feitos sobre as suas cabeças lhes inspirem ideias asquerosas. (...)"
1 comentário:
Eheheheheheh!
Bom programa para a Formação Cívica!!!!
Para que um dia mais tarde não existam professores como os actuais, convém começar a treinar, desde já, os alunos com base neste tratado de BM
;)
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