florestas

Floresta dos plátanos, choupos, freixos, faias, salgueiros, olmos, oliveiras, castanheiros, carvalhos, sobreiros, azinheiras, pinheiros bravos e mansos....
Um blog para seres da floresta, do deserto, dos grandes mares, das planícies, das montanhas, dos rios, das rias, das cidades... não acessível a tias!

domingo, dezembro 31, 2006

sábado, dezembro 30, 2006


Extingue-se o dia
mas não o canto
da cotovia

Matsuo Bashô
Ia o Sol já preparado
à tarde, p' ra s' esconder.
Mas viu-te ficou parado
e adormeceu sem morrer.

Sebastião da Gama

segunda-feira, dezembro 25, 2006

domingo, dezembro 24, 2006

sábado, dezembro 23, 2006

Natal com renas



Nas casas de hoje há muitos problemas de arrumação. Há sempre coisas fora do sítio, ou não há sítio para as coisas. Isto é mais verdade nas casas das pessoas ricas e poderosas, como aquelas que têm poder para lixar a vida dos outros, não que eu as visite, mas tenho um amigo que subiu na vida (sem ser a pulso, mas a tornozelo) e que ainda hoje me atura e me vai dando alguns pormenores das casas dessas pessoas, que ele frequenta e eu não.
Foi a pensar nisso que eu me pus a pensar como seria bom que certas pessoas fossem renas, cabides não faltariam para pendurar as coisas hoje mal arrumadas, ficaria tudo dependuradinho e a rena arrumada também em qualquer lado...
Estou-me a lembrar de coisas que se poderiam pendurar nos cabides orgânicos de algumas pessoas. Por exemplo: o despacho 13 599, o ECD, a reforma tardia, as aulas de substituição não pagas, os dichotes maldizentes sobre professores, o congelamento das progressões, a impossibilidade de progressão, a desvalorização de uma classe inteira, enfim as inúmeras coisitas que têm para pendurar e... arrumar.
É por isto que eu acho que algumas pessoas se deviam transformar em renas: faziam as delícias da pequenada que viam alguma utilidade em certos bichos, ganhavam espaço de arrumação, davam utilidade aos cabides ponteagudos que possuem, tornavam a documentação de mais fácil consulta (sempre exposta), incorporavam melhor o espírito natalício... Enfim, só vantagens!
É isso que lhes desejo neste Natal! Que se transformem em renas e fiquem mais arrumadas!

quarta-feira, dezembro 20, 2006

A minha Pátria é a TLEBS

NATAL À BEIRA-RIO

Repito um poema de DMF que coloquei noutro blog, há para aí um ano...
Mas se é Natal e gosto...
E se tem rio...
E se sabe a Lisboa
a que não resisto...

NATAL À BEIRA-RIO

É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infância ressurrecta.
Da casa onde nasci via-se perto o rio.
Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!
E o Menino nascia a bordo de um navio
Que ficava, no cais, à noite iluminado...
Ó noite de Natal, que travo a maresia!
Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.
E quanto mais na terra a terra me envolvia
E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.
Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me
À beira desse cais onde Jesus nascia...
Serei dos que afinal, errando em terra firme,
Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?

David Mourão-Ferreira

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Confiança





O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura…
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova…

Ainda Miguel Torga

domingo, dezembro 17, 2006

Dies Irae

Apetece cantar, mas ninguém canta.
Apetece chorar, mas ninguém chora.
Um fantasma levanta
A mão do medo sobre a nossa hora.

Apetece gritar, mas ninguém grita.
Apetece fugir, mas ninguém foge.
Um fantasma limita
Todo o futuro a este dia de hoje.

Apetece morrer, mas ninguém morre.
Apetece matar, mas ninguém mata.
Um fantasma percorre
Os motins onde a alma se arrebata.

Oh! maldição do tempo em que vivemos,
Sepultura de grades cinzeladas,
Que deixam ver a vida que não temos
E as angústias paradas!

Miguel Torga

sexta-feira, dezembro 15, 2006

Hai-Kais


Sentado, escreve e lembra
imagens que não viu.

Jorge de Sena
Amei a mulher amei a terra amei o mar
amei muitas coisas que hoje me é difícil enumerar
De muitas delas de resto falei

Ruy Belo

Copiando um gosto... matemático!


O sol arde
sem compaixão
Mas o vento é de Outono


Matsuo Bashô


Imagem retirada de:http://www.ovillan.com/plantando-libros.htm



quarta-feira, dezembro 13, 2006

O G(U)IA

Numa escola dos arredores de Lisboa, onde passei grande parte da minha vida profissional, existe há alguns anos um projecto de nome G(U)IA - Gabinete de Integração dos Alunos...
Nesse espaço recebem-se os alunos com mais dificuldade de integração na escola, os que querem desabafar, os que "apenas" querem conversar, os que nada querem "dizer" (por palavras), os que "vêm para a rua" e depois voltam às aulas (ou não), os passageiros habituais que querem saber coisas dos professores e da escola, enfim os alunos que lá queiram ir...
Participei nesse projecto, como em muitos outros, porque me entendia como professor numa perspectiva ampla, capaz de responder às questões da minha matéria e de dar contributos para a resolução de problemas dos "meus miúdos", utilizando a minha experiência, algum saber acumulado ao longo dos anos de ensino e de convivência com os "putos".
Um dia tive de sair da escola, não era do quadro de lá... era de outro quadro.
E despedi-me!
Com um relatório de actividades.
Assim:

O G(U)IA É POESIA

É o professor que o envia
E o professor que o ouvia
Mais o aluno que queria
E aquele que nada dizia

É o que diz tudo
É o outro carrancudo
É um zangado
E outro apaixonado

É o miúdo que ri
Um que não queria estar ali
Este que só fala
Aquele que tudo cala

É um Sempão
É outro sem razão
É um Botelho
E um espelho

É o puto irritado
É o sorriso disfarçado
É o riso daqui
É o choro dali

É a história que se conta
No livro em que se aponta
Aquilo que se fez
Tudo de uma vez

É um problema
Às vezes um dilema
Uma coisa importante
Um instante

É um momento
Um acontecimento
Uma presença
Sem sentença

É a coordenadora
Uma senhora
Uma Graça
Que não passa...

É um Guia
Uma mania
De encontrar
Uma maneira de estar...


Ecce

Hoje relembro esses tempos (que não situo no tempo)!
E acho que tudo isto ainda faz sentido!
O resto é que já não!

segunda-feira, dezembro 11, 2006

ES PAP

Bem-Vindo ao site da ES PAP - Empresa de Serviços Para Alojamento de Penduras.

Amigo nosso que esteja pendurado, a ganhar só 3000 E por mês, nós alojamos. Já temos alojados 34 directores, 272 subdirectores, 2176 assessores da direcção, 17408 chefes de gabinete, de sub-gabinete, de sala, de despensa, 139264 secretárias, secretários e outros operários de gestão de recursos humanos excedentários.
Desalojamos uns rapidamente e alojamos outros ainda com mais velocidade.
Por cada desalojado, criamos 8 amigos alojados.
O nosso lema é o nosso tema:
Alojamos a Amizade para uma Administração de Qualidade!
É bonita a amizade!
Um valor a preservar!

domingo, dezembro 10, 2006

Debate

O debate sobre temas da educação está obsoleto. O Ministério não o diz, mas age como se esta fosse uma verdade absoluta, tão absoluta que o tema não o preocupa! Isso é preocupante, mas para os responsáveis é irrelevante!
Temos um ME actuante, de falta de legislação ninguém o pode acusar, mas submetido a uma lógica empresarial, que obviamente nada tem a ver com as escolas.
Adoptaram-se chavões "novos" - racionalização de meios, produtividade, empreendedorismo, eficácia, polivalência, mobilidade, excelência e outros - todos eles medidos por indicadores "estatísticos", que deixam de fora muito do que se passa nos sítios em que a educação se faz...
Deixa-se de fora o que de "Humano" se passa nas escolas. Esqueceu-se o manancial de motivação e de vontades que faz funcionar parte substancial do sistema.
Reduzidos a exercícios aritméticos e estatísticos que têm à força de dar certo, alunos, professores e funcionários veêm-se enredados numa teia...
Uma teia que apenas espera deles que não dêem muita despesa, sejam eficazes mas sem saberem bem em quê...
Em tudo?
Em que partes têm de ser excelentes? Em todas?
Ou aponta-se para a excelência com o claro objectivo de que não se atinja e se possa, deste modo, "racionalizar os custos"?
Como vai longe a "Formação Cívica" que a escola devia prestar...
Como está longe o papel de "Ensinar" que a escola devia ter...
Quem se interessa por isto?
O ME não! A sociedade, aparentemente, também não, presa que está da pressão dos discursos manipuladores de quem não quer que o cidadão pense!

"O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito
- Sabe pensar"

O Vosso tanque General, é um carro forte


O Vosso tanque General, é um carro forte

Derruba uma floresta esmaga cem

Homens,

Mas tem um defeito

- Precisa de um motorista


O vosso bombardeiro, general

É poderoso:

Voa mais depressa que a tempestade

E transporta mais carga que um elefante

Mas tem um defeito

- Precisa de um piloto.


O homem, meu general, é muito útil:

Sabe voar, e sabe matar

Mas tem um defeito

- Sabe pensar


Bertold Brecht

sexta-feira, dezembro 08, 2006

Preocupações


Milu é um miúda preocupada!

Digo miúda, porque efectivamente é miúda [no sentido de pequenina, minimalista, com ideias muito básicas e um voluntarismo de miúda a quem foi prometida um prenda e que agora não larga os pais até a a obter].

É uma miúda preocupada e voluntariosa!

Dito isto, Sis Nistra vem fazendo um trabalho de excepção que resulta do labor intelectual em que labuta para resolver as suas preocupações.

As preocupações não são muitas, mas são de peso:
a) Fazer escolas "boas" para agradar ao chefe;
b) Fazer escolas "boas" sem professores;
c) Fazer escolas "boas" sem investir na educação;
d) Fazer escolas "boas" sem cidadãos;
e) Fazer escolas "boas" para agradar aos empresários (palavra que em Portugal podia ser substituída por subsidiários)
f) Fazer escolas "boas" para agradar aos comentadores;
g) Fazer comentadores para agradar à populaça;
h) Fazer crer ao mundo que a salvação do país depende do nível de castigos a aplicar aos professores (esses calaceiros) ;
i) Fazer acreditar que se está a tratar de educação, quando na realidade se está a falar de desacreditação inteirinha de uma classe, em benefício da poupança insana, a ser consumida noutro lado qualquer, com uma elite qualquer, de poderes insondáveis.
j) Fazer crer que o país jamais avançará se ela não fizer dos professores seres obedientes e cumpridores (mais assim: frágeis, dependentes do miserável ordenado que lhes paga...);
l) Fazer das escolas reproduções acéfalas da vontade de um ou dois iluminados, vindos sabe-se lá de onde até aos cargos nacionais que hoje ocupam, com um misto de sabedoria ( e sensaboria) e exigência ( afinal o país tem de progredir);
m) Fazer crer que o seu discurso vazio de ideias e medíocre é o discurso necessário, o programa que salva, o Messias que aí vem...

Depois disto tudo, ainda há quem lhe venda lingerie ( visão apocalíptica) e que lhe lave a roupa interior (obrigado Almada, por nos dares ideias...)

Se falarmos de cuecas e cagadas não estamos longe de verdade, mas sempre nos dirão que o mau cheiro vem das aulas, que quem produz o mau cheiro são os professores, esses privilegiados incontinentes, a quem, definitivamente, é preciso pôr travão!

É que toda a merda do país se concentrou nas escolas e não há perfume que resolva, deve-se portanto proibir os professores de evacuar, pelo menos nas horas de serviço!

“Quem evacuar jamais será titular”, parece ser esse o slogan de Sis Nistra…

E um peidinho posso dar?

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Perfilados de medo

Perfilados de medo, agradecemos
o medo que nos salva da loucura.
Decisão e coragem valem menos
e a vida sem viver é mais segura.

Aventureiros já sem aventura,
perfilados de medo combatemos
irónicos fantasmas à procura
do que fomos, do que não seremos.

Perfilados de medo, sem mais voz,
o coração nos dentes oprimido,
os loucos, os fantasmas somos nós.

Rebanho pelo medo perseguido,
já vivemos tão juntos e tão sós
que da vida perdemos o sentido . . .

Alexandre O'Neill

sábado, dezembro 02, 2006

O ME mudou de instalações


A nova morada é:




Para a História do Adjectivo em Portugal|||

Vigaristas, intrujões, trapaceiros, burlões, mentirosos, embusteiros, charlatães, trafulhas, aldrabões, enganadores, falaciosos, pulhas, impostores, falsos, cabotinos, pantomineiros, trampolineiros, incompetentes, capciosos, falaciosos, traiçoeiros, falsos, hipócritas, inaptos, arrivistas, manhosos, ardilosos, cavilosos, fraudulentos, pérfidos, aleivosos, desleais, fingidos, dissimulados, velhacos, untuosos, incapazes, ambiciosos, videiristas, bajuladores, untadores, enganosos, impostores, insidiosos, perversos, afectados, encobertos, sonsos, dúplices, arteiros, gordos, gordurentos, gordurosos, oleosos, escorregadios, ineptos, ignorantes, estúpidos, açambarcadores, avaros, ávidos, cobiçosos, gananciosos, interesseiros, invejosos, aduladores, servis, lisonjeadores, louvaminheiros, lambe-botas, engraxadores, graxistas, falazes, corruptos, corrompidos, desumanos, maus, inúteis, ruins, disfarçados, embuçados, finórios, anafados, besuntados, sebentos, sebosos, perigosos, evasivos, furtivos, imbecis, incultos, obtusos, estultos, néscios, ignaros, boçais, burros, asnos, asininos, lerdos, baixos, torpes, vis, sabujos, sôfregos, insaciáveis, egoístas, abjectos, manteigueiros, putrefactos, bastardos, abastardados, carniceiros, selvagens, ferinos, ferozes, brutais, imorais, amorais, execrandos, iníquos, malditos, daninhos, nocivos, nefastos, funestos, matreiros, cevados, emporcalhados, lambuzados, imundos, nojentos, tontos, patetas, mentecaptos, aziagos, mórbidos, doentios, insalubres, malignos, desonestos, indignos, obscenos, sórdidos, reles, ignóbeis, repugnantes, asquerosos, miseráveis, desprezíveis, hediondos, repulsivos, nauseabundos, pestilentos, injustos, irresponsáveis, imprudentes, levianos, ligeiros, insensatos.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Sociedade...Social!

Aviso Importante: Este escrito não é um exercício de demagogia!

Segundo a National Geographic de Dezembro, "o governo da Grã-Bretanha oferece empréstimos livres de juros para comprar arte. Desde que comprem uma peça de arte (pintura, escultura, têxtil,vidro, cerâmica) de uma das 250 galerias participantes, os britânicos podem contrair empréstimos até 2 760 euros e têm dez meses para pagar. (...) Já foram autorizados mais de 4500 empréstimos no valor de 4,7 milhões de euros."
Fica a aqui uma sugestão para o governo nacional, uma forma de dar resposta às preocupações sociais que tem demonstrado como nenhum governo europeu. Podia o governo lançar uma campanha de sobrevivência, concedendo empréstimos avultados a pagar em três gerações. A propaganda a estas medidas (coisa que o governo tem usado pouco) poderia ter o seguinte slogan:
"Sobreviva hoje que o seu neto paga amanhã!"
Às famílias que conseguissem sobreviver, seria atribuído um cupão electrónico ou um chip (modelo choque tecnológico) a incorporar no corpo dos descendentes responsáveis pelos pagamentos, de modo a que eles não se esquecessem de os efectuar.
É apenas uma sugestão! Os senhores ministros, nas suas infinitas sabedorias, decidirão!

terça-feira, novembro 28, 2006

Depois do ECD o EBM


Depois de publicar o ECD, Milu, preocupada que anda com a alarvaria dos docentes, decidiu fazer publicar o EBM - Estatuto das Boas Maneiras, tendo por base um texto ainda hoje muito actual, publicado no século XIX por um assessor (do Ministério da Educação de hoje?) de nome João Félix.

Ramalho Ortigão, em As Farpas, escreveu sobre o assunto:

"Em Portugal todas essas coisas se aprendem nas escolas de instrução primária, e da disciplina formada do conjunto desses preceitos são os alunos devidamente examinados nos liceus nacionais.

O mestre das maneiras portuguesas não é Talma, nem Madame de Girardin, nem Balzac, nem Emerson, nem Carlos Dickens. É simplesmente o Sr. João Félix Pereira, médico, engenheiro civil e agrónomo.

Vejamos algumas dessas leis que as crianças decoram para os seus exames e pelas quais os adultos se governam nas suas correlações sociais.

Para que o sujeito possa a todos os respeitos considerar-se um gentleman, acha conveniente o Sr. João Félix:
1º Que ele faça a barba.
2º Que se não ponha à janela em mangas de camisa nem com o pescoço descoberto.
3º Que quando escarrar o não faça sobre a cara de pessoa com quem fale (maxime se é uma pessoa de respeito!)
4º Que não tenha os olhos em contínuo movimento.
5º Que nos jantares de etiqueta não limpe os ouvidos com o palito com que houver de palitar os dentes.
6º Que não arrote à mesa.

O Sr. João Félix especifica ainda, com um escrúpulo pelo qual nunca lhe poderemos votar o suficiente reconhecimento, que diante de gente de respeito se não cortem as unhas. E assim é! Achando-nos na presença de pessoas que respeitemos, como, verbi gratia, Sua Majestade El-Rei, um príncipe estrangeiro, um embaixador ou uma rainha, o pormo-nos repentinamente a cortar as unhas - principalmente sendo estas as dos pés - poderia ser tido por acto menos palaciano.

Se o Sr. João Félix nos permitisse um leve apêndice aos seus conspícuos preceitos, diríamos que cortar os calos nos parece também operação que só em caso de muita necessidade nos deveremos permitir no meio de grandes assembleias.

Quando se transpire depois da valsa, mudar de camisa no meio de um salão, sem previamente haver obtido para esse fim a permissão da dona da casa, igualmente nos ocorre que poderia por alguns ser talvez arguido como acto de menos etiqueta...

Tratando do modo de proceder à mesa do jantar faz o Sr. João Félix Pereira duas observações muitíssimo sábias.

A primeira é que não tomemos pitada de rapé pelo meio das coisas que estivermos comendo.
Compreende-se todo o alcance desta advertência, reparando-se, por um só momento que seja, nos equívocos a que podia dar origem a concorrência do rapé com os acepipes, resultando por exemplo lançar-se a pitada sobre a salada e meter-se no nariz beterrabas!

A segunda advertência é que nunca metamos bocado nenhum na boca enquanto não tivermos engolido o bocado antecedente. Ninguém imagina sem o ter experimentado quanto importa ser cauteloso na matéria deste capítulo! Metendo na boca os bocados sem tomarmos a deliberação de os irmos sucessivamente engolindo, chegamos por espaço de tempos a uma indefinida aglomeração de bocados dentro da nossa boca. As pessoas que insistem, por tenaz grosseria, em não engolirem os bocados que vão metendo consecutivamente na boca caem, ao cabo de alguns dias dessa terrível incúria, na dura necessidade de depositarem os bocados antigos que tenham entre a maxila superior e a maxila inferior, a fim de receberem bocados novos. Quando isto haja de se fazer convém que se tenha em vista o que o Sr. João Félix discretamente consigna com respeito aos escarros, isto é: que tais esvaziamentos se façam o menos que ser possa sobre os penteados das pessoas que nos cerquem, e muito mais particularmente quando estas tenham tido a precaução de nos advertir de que tais depósitos feitos sobre as suas cabeças lhes inspirem ideias asquerosas. (...)"

Rigor


Vamos ser rigorosos...! Parece que até agora não o éramos... Éramos uma espécie de diletantes, bem ou mal (segundo o ME) intencionados, uns gajos pouco cumpridores, razão pela qual a educação chegou onde chegou (isto é o ME a falar).
Temos de ser rigorosos, tanto como o ME. E devemos mesmo ser. Cumprir o nosso horário à risca, não deixar nem mais um minuto por conta da boa vontade. Não há mais boas vontades! Há o escrupuloso cumprimento do que nos é imposto. Se assim for, pode ser que alguns Conselhos Executivos façam chegar à tutela o péssimo ambiente que há nas escolas, o descontentamento que se apoderou de nós...com imenso rigor.
Sejamos rigorosos, portanto. O despacho 13599 assim obriga, o ECD vai mais longe... Temos uma carga lectiva, temos uma carga de escola, temos uma carga de reuniões, temos uma carga de casa..., temos um limite de faltas, temos imensos limites de progressão, só não temos um limite de trabalho, aí parece que tudo vale...
Mas não vale e não pode mesmo valer!
Se nos tratam como funcionários do papel, aqueles que cumprem o seu horário, seremos funcionários do papel, cumpridores de horários e... de tarefas... e nada mais!
Vamos cumprir, para não faltar.
Portanto, se temos no horário duas horas de reuniões, vamos cumprir. Não vamos é ficar 5 ou 6 horas em Pedagógico para que a escola funcione. Vamos cumprir! Vamos ser os profissionais cumpridores que até hoje não éramos.
Se temos projectos que nos tiram horas à família é porque os projectos estão a mais!
Se os alunos querem coisas diferentes, coisas que a escola sempre ofereceu (no tempo de casa dos professores), vamos exigir que se marquem no horário. Isto de trabalhar de borla tem de acabar.
Não há ou não deve haver relações na escola para além das estritamente marcadas nos horários. Sejamos profissionais! Muito profissionais! Se tivermos de prolongar as nossas horas de acompanhamento do que quer que seja, façamos informações de serviço aos Conselhos Executivos (para que tudo fique registado).
Qualquer coisa como "hoje, a miúda nº X, da turma Y, do ano N, chorou porque não teve a nota no teste que esperava e eu, professor profissional, fiquei no meu intervalo a falar com ela. Devem-me 20 minutos!!
Parece absurdo???
Absurdo é o tratamento que nos deram. O resto é só profissionalismo!
Pareço zangado???
Não pareço, estou mesmo!
E vou cumprir horários, e cumprir tarefas dentro do meu horário.
Quando a "hora" acabar, eu acabo...!!!
Pode ser que não me canse tanto como me cansava, que não invista tanto como investia e ainda assim consiga ser cumpridor... de horários.
Parece que até hoje não era!
Era só calão!
Este post é demasiado emocional?
Não!
Este é o post da racionalidade!
Emocional e enormemente profissional era o que fazia até agora!
Com o novo ECD, vou limitar-me a ver o que tenho de fazer para não ser mais castigado!
É que estou farto de ser castigado sem perceber porquê!

segunda-feira, novembro 27, 2006




Pastelaria

Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura
Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio


Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!


Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício


Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola


Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come


Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:

Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora - ah, lá fora! - rir de tudo


No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra





Mário Cesariny


domingo, novembro 26, 2006

Castigos, avaliações e... invenções!

Hesitei! Hesitei muito. Não sabia (e ainda não sei) se devia relatar um exemplo pessoal, poderia parecer uma coisa egocêntrica, um "lá está ele preocupado com a vidinha dele", uma merdice sem sentido global. Mas os tempos vão tão maus que as hesitações se foram e aqui fica, ao correr do teclado, um testemunho.
Entrei aqui em 1984 para fazer uma substituição. Gostei, mas tive de sair! Voltei anos a fio em mini-concursos (viam-se as colocações à luz de isqueiro, na 24 de Julho ou na 5 de Outubro, à noite que era quando saíam - falta de respeito total). À medida que os anos passavam, os horários duravam mais tempo e o gosto foi-se entranhando. Era provisório (o que quer que isso queira dizer)! Alguns anos depois comecei a perceber que havia colegas efectivos e que para o ser tinha de fazer estágio. Mas não podia, o ME não chamava ninguém, nas universidades não nos queriam (faziam estágios integrados e os moços passavam-nos à frente nos concursos), já tinham gente de sobra, e nós permanecíamos provisórios. Fizemos uma associação de provisórios de História ( um grupo terrível na altura) e, depois de várias peripécias, lá conseguimos que o ME nos deixasse fazer estágio pela Universidade Aberta, desde que fôssemos nós a pagar. Pagámos o estágio inteirinho e já tinhamos passado muitos anos a leccionar! Fomos os primeiros QZP'S e deixámos de ser para ser QE'S. Parecia bom depois de tantos anos como provisórios! Estávamos longe, mas pronto, éramos de um QE! Fomo-nos aproximando, até já podíamos ter filhos e foi o que fizemos de melhor. Estávamos meio velhotes, mas os miúdos cá de casa compensavam a idade e nem tinham consciência que os pais já tinham trinta e muitos. A vida endireitava-se, pelo menos parecia, entre o gosto de dar aulas e os benefícios que isso trazia, a família (com muito esforço) lá havia de compreender que queríamos ser professores. E fomos! Mas além disso fomos pais, e psicólogos, e professores do ensino especial, e professores outra vez, e fomos de um Conselho Executivo e fomos Directores de Turma, e fomos de Conselhos Pedagógicos e fomos formadores de informática (a custo zero), com os custos de chatear os colegas que sabem de informática...
Já fomos tudo! Para o ME não fomos nada!!!! E não podemos progredir, mesmo que apresentemos em relatório os resultdos dos vários projectos em que estivemos envolvidos e em que o ME fez pressão para que nos envolvêssemos: Posso citar, assim de lembrança, os "Todos Diferentes, Todos Iguais", o "Entreculturas", o Nònio, o Prodep... o raio que os parta.!
Mas, no percurso, ainda construímos um Centro de Recursos que faz inveja à Finlândia e ainda fizemos várias páginas da internet das escolas, e blogs do nosso grupo...
Para quê? Para nada! Estamos impedidos de progredir! Para outros professores esta conversa nem faz sentido: estão impedidos de o ser (mesmo que tenham montes de anos de ensino). Professor actual é professor barato! Nem outra coisa seria de esperar depois da desvalorização intencional que estes seres cavernosos fizeram da classe docente! A escola vai melhorar??? Eu, que consegui fazer isto tudo, "sem ser avaliado, sem ser bom profissional", permito-me duvidar, muito, mas mesmo muito!!!!!!! Sinto-me o Professor Dodot, depois de limpar a merda que eles fazem, passo a ser descartável.
Para outros, mais novos, esta conversa nem tem sentido. Eles são a escumalha da educação (para o ME). São gente sem emprego, não são professores, professor é aquele que morre pobre e... missionário!
É a escola onde os valores são os valores do que se pode poupar.
E se eles se fossem ...???

sexta-feira, novembro 24, 2006

Uma coisa interessante neste dia 23-11-2006


"Assassinos a Soldo", assim se chama a versão portuguesa que tem vindo a ser preparada e que, como sempre, apresenta alguns problemas de tradução.
Ora digam lá se a tradução está bem feita...
"Assassinos a Soldo" - Uma Tragédia em Muitas Partes

domingo, novembro 12, 2006

Diz-se... mas é mentira, é claro!


Diz-se por aí, nos corredores das escolas, que La Sinistra, no seu elevado grau de competência legislativa, está a preparar medidas que vão revolucionar a educação no cantinho dos 10 000 000. São medidas fundamentais, necessárias, imprescindíveis: a) criação da disciplina de Poupança 1; b) criação da disciplina de Poupança 2 (com precedência); c) criação da disciplina de Poupança 3 (com aprovação do relatório de contas); d) criação de um quadro de contratados desempregados que poderão deixar de ser desempregados se se quiserem empregar de borla; e) criação de um quadro de supranumerários, que são aqueles que estão para além dos números apresentados no relatório de contas de Poupança 3; f) criação de um quadro de Aqui Parados na Carreira e activos, retroactivos, hiperactivos na trabalheira, de nome Baratos, por parte da mãe e do pai também!, g) criação de um quadro de titulares que são aqueles que vão pular em todos os lugares... São medidas que alteram substancialmente o Currículo Nacional, nada têm a ver com professores, mas apenas com melhorias necessárias à Educação. Todos estes quadros têm extinção prevista para breve, sendo criados em substituição quadros de vigilantes educativos, com vários graus de vigília e vigilância, sendo o último o dos professores titulares de todas as vigílias e vigilâncias: O Grande Vigilante que nos há-de a todos ensinar... a educar e a poupar!

sexta-feira, novembro 10, 2006

Respeitinho!













Esta coisa começou mal!
É que tenho tendência a ficar chateado quando me chamam calaceiro, preguiçoso e outros dichotes...
Já ficaria se fosse um gajo qualquer da rua que me chamasse isso, mas fico mais quando é a ministra que o afirma, ou que o dá a entender, ou que o insinua.
Fico chateado!
Não que isso tenha uma importância por aí além, mas fico...
E se ao gajo da rua eu responderia com argumentos de pacifista em dia de greve, à ministra perdi-lhe o respeito... totalmente!
Não gosto de ser insultado, chateia-me ser insultado, aborrece-me!
E mais, ainda gosto menos de ser subvalorizado para me poderem legalmente roubar! Aborrece-me muitíssimo!
Ora é isto tudo que o novíssimo ECD consagra! A desvalorização completa de uma profissão que é composta, segundo a tutela, por profissionais parasitas, calaceiros e preguiçosos e, por isso, têm de ser castigados, têm de ficar Aqui Parados...! Ou isso, ou têm de ser reeducados, com base na ética do trabalho em excesso e despropositado que os há-de libertar... para uma estagnação na progressão.
Não se pode oficialmente progredir porque isso sai caro!
Preparou-se o terreno nos media, mandaram-se alguns comentadores dizer que assim é que deve ser, alguns economistas de renome (os mesmos que puseram Portugal no leque dos países mais ricos da UE) juraram a pés juntos que nem pode ser de outra maneira, excelentes são só alguns e basta saber fazer contas para saber quantos são (é isso que ensina a mãe de todas as ciências, a mais importante, a Economia, e a tia, a Política, não contradiz).
Ora bolas, isto chateia-me, mas isto é a mim que sou popular (do povo) e que queria progredir e não posso.
Era como dizer ao Miguel Sousa Tavares, querendo ele escrever o Equador, que não podia passar do Bojador. O tipo não ia gostar! E às tantas havia de se queixar de falta de respeito e afirmar que queria ser respeitado e que queria liberdade para progredir até ao Equador!
Pois bem, a falta de respeito para com os professores é total!
É mesmo um caso exemplar, em que os responsáveis se dão ao luxo de desconsiderar publicamente uma classe inteira de profissionais, a bem do país e da nação!
De que país e de que nação estarão a falar? Do país da corrupção, dos privilégios, da nação dos amigos?
Confesso-me pouco inteligente para entender os nossos governantes. Mas digo também que não sou nem nunca fui loiro!
Mas o respeitinho é bonito e eu gosto!

Se não o tiver, dispenso-me de o exercer!

terça-feira, novembro 07, 2006

PFP sobre o ECD - Perguntas frequentemente perguntadas sobre o ECD


O que é o ECD?

O ECD é um estatuto de uma carreira, supostamente docente.

Para que serve um estatuto de uma carreira?

Para organizar a carreira, definir funções, adequar a prática profissional dos docentes a ideias que estruturam a educação.

Que ideias são essas?

O Ministério não sabe!. O Ministério diz tê-las, mas não é seguro em que departamento estarão guardadas.

Quem pode apresentar essas ideias?

Toda a gente, mas têm sido privilegiados os comentadores televisivos, os economistas reformados e simultaneamente no activo, os reformadores moralizantes da vida pública, com ordenados, privilégios e benesses pessoais chocantes em termos sociais.

As pessoas "preocupadas com o futuro do país" podem apresentar as suas ideias?

Podem, desde que sejam comentadoreiros de imagem reconhecida, assessores de alguma empresa com subsídios comunitários, membros do governo, economistas em geral, sobretudo os que afirmam não ter responsabilidades no estado da nação.

Os profissionais do sector também podem apresentar propostas?

Podem, desde que o façam baixinho e de preferência caladinhos.

Existem medidas significativas para a educação no ECD?

Existem várias medidas muito significativas que se centram em dois temas fundamentais: reduzir e aumentar.

Reduzir e aumentar??? Isso não é contraditório?

Não! Nada!
Reduzir professores, reduzir o número de contratados (para o ME não são professores) reduzir a possibilidade de ter carreira, reduzir a progressão na mesma, reduzir salários, reduzir direitos elementares como o de estar doente, reduzir o tempo de preparação de aulas, reduzir o tempo para os professores se actualizarem, reduzir o tempo para concertarem estratégias e procedimentos, reduzir a possibilidade de ser bom professor, reduzir a imagem do professor à imagem de pária social, reduzir o papel do professor na escola que passa a ser um faz-tudo baratinho, reduzir os professores a executantes de medidas a metro com a lógica do milímetro, reduzir o estatuto e o prestígio dos professores (afinal eles são os pais e as mães dos males da escola) reduzir a despesa/investimento na educação a um nível digamos…. muito reduzido.

Então o que é que vai aumentar??

Aumenta o trabalho com menos salário, aumentam as horas lectivas disfarçadas de actividades educativas, aumenta a idade da reforma, aumenta o número de desempregados, aumentam os despedimentos, aumenta a não contratação de docentes, aumenta o trabalho escravo que permite isto tudo, aumenta a quantidade de tarefas exigidas aos professores, aumenta o disparate na avaliação dos docentes (aberta a tios, primas e outros familiares em quarto grau) aumenta a impossibilidade de se ser excelente dada a multiplicidade de tarefas diferentes exigidas, aumenta a falta de tempo de preparação para isso tudo, aumenta a exigência de excelência com condições de demência, aumenta a tentativa de levar à prática o adágio “querer ópera séria pelo preço da ópera bufa”, aumenta a impossibilidade de progressão na carreira, aumenta a manutenção de muitos dos professores em condições salariais de saldo, aumenta o desprestígio da profissão (essa a intenção), aumenta a escola dos desmotivados e paralisados, aumenta o nível de loucura para um nível… aumentado.

E não se cria nada de novo?

Sim, seguramente! Cria-se poupança imediata e irracional, cria-se a breve trecho a escola pública manhosa, onde ninguém quererá leccionar, cria-se um sistema de precariedade onde ninguém quererá estar…

Ainda há quem queira ser professor??

Sim há! Os excelentes professores que estão no ensino e que já eram professores antes de a ministra ser ministra, e que continuam a ser professores enquanto a ministra continua surda, arrogante e prepotente.

Mas a educação não é importante para o país?

É muito importante, até os responsáveis dizem o mesmo, mas fazem tudo para que não seja, e desconsideram os seus profissionais para que a sua profissão seja subvalorizada.

Isso não é um paradoxo? O que é um paradoxo?
Um paradoxo é tudo isto…!
E é apenas isto?
Não!! Também é ter uma ministra da educação que a não tem!

domingo, novembro 05, 2006

Actividades Educativas







Procurando no google (imagens) por actividades educativas apareceu-me isto:



















Fiquei na dúvida! Devemos fazê-las ou não? Estas são pagas? Implicam uma nova proposta para o conteúdo funcional dos docentes?
Tudo coisas a perguntar a Maria das Actividades Educativas a Preço Zero, MAEPZ para os íntimos.

o S de quem?




Salazar, no seu culto do chefe e do sacrifício nacional, do Portugal dos Pobrezinhos Obedientes, servia-se de uma propaganda bastante activa que exaltava a figura do chefe e das medidas de salvação nacional. Tudo servia: eram as Lições de Salazar, eram os livros da escola, a exposição do Mundo Português, a Mocidade Portuguesa com a fivela do cinto com um "S".
Diziam-se piadas, murmuradas, acerca do "S".
Mas propaganda a sério é agora. Tudo serve, desde que dê visibilidade... Até revistas no estrangeiro (ehehehehe).
Parece que os professores e os alunos terão de voltar a usar cinto uniforme, com um "S" igualmente, sabe-se lá porquê...
As piadas adaptam-se e as canções ganham novos refrões.
Pode ser que este se aplique:

"Sou soldado socialista
Sem Sócrates saber
Se Sócrates soubesse
Seria sério sarilho. "

Mas pior, pior, será se Sócrates e a Maria das Actividades Educativas Isentas de Salário se juntam na fábrica dos cintos.
É que cintos "SM" já será um bocadinho demais...

quinta-feira, novembro 02, 2006

Renoir - Raparigas de Preto

XLVI
(Finjo que não vejo as mulheres que passam, mas vejo)


De súbito, o diabinho que me dançava nos olhos,
mal viu a menina atravessar a rua,
saltou num ímpeto de besouro
e despiu-a toda...

E a Que-Sempre-Tanto-Se-Recata
ficou nua,
sonambulamente nua,
com um seio de ouro
e outro de prata.

José Gomes Ferreira

quarta-feira, outubro 25, 2006

Respiro o teu corpo

Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,
sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca.

Eugénio de Andrade


















Auguste Rodin - O Beijo

sábado, outubro 21, 2006

Dedicado aos democratas do ME


Um pequeno trecho de uma composição muito popular:

(...)

Saudai o Sol que desponta
Sobre um ridente porvir;
Seja o eco de uma afronta
O sinal de ressurgir.
Raios dessa aurora forte
São como beijos de mãe,
Que nos guardam, nos sustêm,
Contra as injúrias da sorte.


(...)

segunda-feira, outubro 16, 2006

O que faz falta
































Quando a corja topa da janela
O que faz falta
Quando o pão que comes sabe a merda
O que faz falta

O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta
O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta

Quando nunca a noite foi dormida
O que faz falta
Quando a raiva nunca foi vencida
O que faz falta

O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é acordar a malta
O que faz falta

Quando nunca a infância teve infância
O que faz falta
Quando sabes que vai haver dança
O que faz falta

O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é empurrar a malta
O que faz falta

Quando um cão te morde a canela
O que faz falta
Quando à esquina há sempre uma cabeça
O que faz falta

O que faz falta é animar a malta
O que faz falta
O que faz falta é empurrar a malta
O que faz falta

Quando um homem dorme na valeta
O que faz falta
Quando dizem que isto é tudo treta
O que faz falta

O que faz falta é agitar a malta
O que faz falta
O que faz falta é libertar a malta
O que faz falta

Se o patrão não vai com duas loas
O que faz falta
Se o fascista conspira na sombra
O que faz falta

O que faz falta é avisar a malta
O que faz falta
O que faz falta é dar poder à malta
O que faz falta

sábado, outubro 14, 2006

Casa















Salvador Dali
Mulher com Cabeça de Flores

Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão. . .

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.

David Mourão Ferreira

segunda-feira, outubro 09, 2006



















A VIAGEM

Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).
Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma o dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.


Miguel Torga, Câmara Ardente

terça-feira, outubro 03, 2006

Poema

Brueghel -The Massacre of the Innocents














Poema

Cantaremos o desencontro:
O limiar e o linear perdidos

Cantaremos o desencontro:
A vida errada num país errado
Novos ratos mostram a avidez antiga

Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, outubro 01, 2006

Dificuldade de Governar




















1.
Todos os dias os ministros dizem ao povo
Como é difícil governar. Sem os ministros
O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Nem um pedaço de carvão sairia das minas
Se o chanceler não fosse tão inteligente. Sem o ministro da Propaganda
Mais nenhuma mulher poderia ficar grávida. Sem o ministro da Guerra
Nunca mais haveria guerra. E atrever-se ia a nascer o sol
Sem a autorização do Führer?
Não é nada provável e se o fosse
Ele nasceria por certo fora do lugar.

2.
E também difícil, ao que nos é dito,
Dirigir uma fábrica. Sem o patrão
As paredes cairiam e as máquinas encher-se-iam de ferrugem.
Se algures fizessem um arado
Ele nunca chegaria ao campo sem A
s palavras avisadas do industrial aos camponeses: quem,
De outro modo, poderia falar-lhes na existência de arados? E que
Seria da propriedade rural sem o proprietário rural?
Não há dúvida nenhuma que se semearia centeio onde já havia batatas.

3.
Se governar fosse fácil
Não havia necessidade de espíritos tão esclarecidos como o do Führer.
Se o operário soubesse usar a sua máquina
E se o camponês soubesse distinguir um campo de uma forma para tortas
Não haveria necessidade de patrões nem de proprietários.
E só porque toda a gente é tão estúpida
Que há necessidade de alguns tão inteligentes.

4.

Ou será que
Governar só é assim tão difícil porque a exploração e a mentira
São coisas que custam a aprender?

Bertolt Brecht


quarta-feira, setembro 27, 2006

Degas - Blue Dancers




















Por delicadeza

Bailarina fui
Mas nunca dancei
Em frente das grades
Só três passos dei

Tão breve o começo
Tão cedo negado
Dancei no avesso
Do tempo bailado

Dançarina fui
Mas nunca bailei
Deixei-me ficar
Na prisão do rei

Onde o mar aberto
E o tempo lavado?
Perdi-me tão perto
Do jardim buscado

Bailarina fui
Mas nunca bailei
Minha vida toda
Como cega errei

Minha vida atada
Nunca a desatei
Como Rimbaud disse
Também eu direi:

«Juventude ociosa
Por tudo iludida
Por delicadeza
Perdi a minha vida»

Sophia de Mello Breyner Andresen

quarta-feira, agosto 09, 2006

Claude Monet
Haystack at Giverny














Entardecer

Cala-se o humano cicio
E rumoreja o arvoredo
em transe como bruxedo
que o coração mal distingue,
outros tempos, doces dores.
Varrem-me o seio tremores
quais relãmpagos de estio.

Joseph Von Eichendorff

domingo, julho 30, 2006

LIsboa



Imagem retirada de http://chamomepatricia.blogs.sapo.pt/

Lisboa

A luz vinha devagar
Através do firmamento...
Vinha e ficava no ar,
Parada por um momento,
A ver a terra passar
No seu térreo movimento.

Depois caía em toalha

Sobre as dobras da cidade;
Caía sobre a mortalha
De ambições e de poalha,
Quase com brutalidade.

O rio, ao lado, corria

A querer fugir do abraço;
Numa vela que se abria,
E onde um sorriso batia,
O mar já era um regaço.

Mas a luz podia mais,

Voava mais do que a vela;
E o Tejo e os areais
Tingiam-se dos sinais
De uma doença amarela.

Ardia em brasa o Castelo,

Tinha febre o casario;
Cada vez mais nosso e belo,
O profeta do Restelo
Punha as sombras num navio...

Nas casas da Mouraria,

Doirada, a prostituição
Era só melancolia;
Só longínqua nostalgia
De amor e navegação.

Os heróis verdes da História

Tinham tons de humanidade;
No bronze da sua glória
Avivava-se a memória
Do preço da eternidade.

Nas ruas e avenidas,

Enluaradas de espanto,
Penavam, passavam vidas,
Mas espectrais, diluídas
Na cor maciça do encanto.

E a carne das cantarias,

Branca já de seu condão,
Desmaiava em anemias
De marítimas orgias
De um fado de perdição.

Miguel Torga

sexta-feira, julho 28, 2006

Lisboa

Esta névoa sobre a cidade, o rio,

Francisco Smith (1881-1961)

[Escadinhas]

Esta névoa sobre a cidade, o rio,

as gaivotas doutros dias, barcos, gente

apressada ou com o tempo todo para perder,

esta névoa onde começa a luz de Lisboa,

rosa e limão sobre o Tejo, esta luz de água,

nada mais quero de degrau em degrau

Eugénio de Andrade

A maior desgraça que pode acontecer a um artista é começar pela literatura, em vez de começar pela vida.
Miguel Torga

procure outras florestas, outras árvores, não hesite...